A Casa Branca divulgou na última segunda-feira uma proposta aguardada há meses que visa proibir a entrada de carros inteligentes chineses no país, sob o argumento de que esses veículos conectados à Internet representam uma ameaça à segurança nacional. A iniciativa, que ocorre em meio a uma crescente disputa comercial com a China, poderá impactar tanto montadoras quanto fornecedores dos EUA que dependem de certos componentes essenciais para viabilizar os sistemas de conectividade em seus automóveis.
"Trata-se de uma manobra política estratégica para prevenir que o problema se agrave a ponto de causar danos irreversíveis. É provável, também, que a medida traga consequências imediatas para algumas empresas do setor", afirmou Avery Ash, vice-presidente sênior de relações governamentais da SAFE, um think tank especializado em segurança nacional.
De acordo com a proposta, elaborada pelo Departamento de Comércio dos EUA, além da proibição de importação e venda de veículos conectados fabricados na China, também seria vedado o uso de softwares e hardwares chineses que alimentam esses sistemas nos veículos vendidos nos EUA.
Se aprovada, a medida concederia às montadoras um prazo de um ano para garantir que o software dos seus veículos conectados não tenha nenhum vínculo com a China. Segundo Ash, para a maioria dos fabricantes, essa mudança não representaria um desafio significativo.
No entanto, a substituição de componentes de hardware afiliados à China pode ser um grande obstáculo. As montadoras teriam até quatro anos para eliminar esses dispositivos dos seus carros, incluindo sensores de bordo, unidades de controle de conectividade, antenas, chipsets e módulos Bluetooth que permitem a conexão dos veículos à Internet.
O Departamento de Comércio considerará, caso a caso, a possibilidade de isentar pequenos fabricantes de veículos da proibição, a fim de evitar interrupções desnecessárias na cadeia produtiva.
Curiosamente, as empresas de veículos autônomos com sede nos EUA não estariam sujeitas às mesmas restrições de hardware que as montadoras tradicionais. A proibição proposta se aplicaria apenas ao uso de software chinês em veículos autônomos de Nível 3 e Nível 4 — categorias nas quais os carros podem operar de forma autônoma em determinadas condições, sendo necessário que um motorista humano assuma o controle em alguns casos no Nível 3. As empresas de veículos autônomos argumentam que o controle total sobre o software minimiza quaisquer riscos decorrentes do uso de hardware.
Por outro lado, a proibição poderia limitar a capacidade de empresas chinesas de veículos autônomos (AVs) de realizar testes e operar nos EUA. Ao longo dos últimos anos, várias startups chinesas de robotáxis, como Nullmax, Pony.ai e WeRide, já realizaram testes no país. Contudo, a maioria delas já interrompeu suas operações, antecipando as possíveis restrições.
A WeRide, avaliada em US$ 5 bilhões e que planejava uma oferta pública inicial (IPO) nos EUA, suspendeu seus planos de abertura de capital em agosto deste ano.
Para Ash, essa regulamentação é fundamental para proteger a segurança nacional, pois os veículos conectados, incluindo os elétricos e autônomos, coletam dados sensíveis de motoristas e passageiros. Além disso, esses veículos possuem câmeras e sensores que não apenas auxiliam na direção automatizada, mas também capturam informações detalhadas sobre a infraestrutura americana.
A proposta faz parte de uma série de restrições impostas pelo governo Biden a produtos de origem chinesa. Essa lista inclui a proibição de tecnologias da Huawei e ZTE, além de restrições a equipamentos de vigilância de marcas chinesas, e investigações sobre o uso de guindastes chineses em portos dos EUA. A justificativa é sempre a mesma: proteger a segurança nacional. O aplicativo TikTok também enfrentou sanções semelhantes sob a administração Biden.
Além disso, a proposta se alinha com a decisão do governo de quadruplicar as tarifas de importação sobre veículos elétricos chineses, elevando-as para 100%, em uma tentativa de combater os subsídios do governo chinês que tornam os preços dos veículos elétricos artificialmente baixos. Essas tarifas dificultaram a entrada de carros inteligentes chineses no mercado americano, impedindo que eles competissem diretamente com montadoras locais.
A União Europeia também enfrenta desafios semelhantes, já que seus fabricantes têm dificuldade em competir com os preços dos veículos elétricos chineses. O bloco está atualmente considerando a imposição de tarifas próprias para lidar com essa concorrência.
Nos EUA, a proibição proposta pode contribuir para o fortalecimento da produção doméstica de veículos elétricos, um dos principais objetivos da Lei de Redução da Inflação (IRA), sancionada em agosto de 2022. Essa legislação oferece incentivos à produção de veículos elétricos e energia limpa, incluindo um crédito fiscal de US$ 7.500 para veículos elétricos montados na América do Norte e que utilizem materiais provenientes dos EUA ou de países parceiros.
A proposta também ecoa uma iniciativa legislativa apresentada no início do ano pela deputada Elissa Slotkin (D-MI), que visa proibir veículos conectados chineses em bases militares americanas e impedir que o Departamento de Defesa adquira tecnologia lidar fabricada na China. Algumas dessas disposições já foram incorporadas ao orçamento anual de defesa dos EUA.
Embora a Rússia também esteja na mira dessa proposta de proibição, o país atualmente não fabrica nenhuma das tecnologias que seriam afetadas pelas restrições.
O governo Biden encorajou as partes interessadas a enviar suas opiniões ao Departamento de Comércio enquanto a regra final é elaborada. Espera-se que a regulamentação definitiva seja divulgada até o fim do ano, conforme declarou um alto funcionário do governo.
Via - TC
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